O Multitarefa e a Especialização caricata

Sempre fui produtor de meus discos. Mesmo quando havia um “produtor in charge” nas gravadoras majors… Compositor, letrista, pianista.  Programador gráfico nas capas e encartes. Programador de teclados e beats. Consertador de órgão transistorizado, lubrificador de órgão Hammond. Trocador de cordas de piano Yamaha e de Clavinet Honner.  Afinador de piano de cauda. Restaurador de laca e de pinturas vinílicas.Técnico de manuteção, soldador de cabos de microfone – aprendi com o legendário Seu Joaquim , na Vice Versa, que me fez de auxiliar e me ensinou a fazer a solda redondinha e brilhante) . Arranjador de metais já no primeiro compacto simples, no Estudio Gazeta, sob produção do Otavinho “Pete Dunaway” Cardoso. Escritor de releases, desenhista de cartazes e lambe-lambes. Colador de Lambe-lambe nas ruas de São Paulo. Fabricador de piano falso de acrílico para ir cantar no Raul Gil e no Bolinha, quando eu odiava não ter piano pra tocar na TV.

E tantas cositas más… Ainda hoje me surpreendo com as opiniões e perguntinhas pertinentes : “Mas quem vai produzir o seu disco ?” “Ah… voce mesmo ? ah… entendi…produção caseira…” Antigamente vinham as sugestões, de Liminhas e Ronnie Fosters, de Malulys, Max Pierres e Mazollas , depois ficou assim:  “Não rola um Roy Cicala ? Um Jack Endino ? “Porque voce não chama o Kassin ? ”  “Marcus Preto ?” “Pupillo” ?  Tó Brandileone ?  … Pessoal, eu amo todos eles ! Os produtores são importantíssimos e foram muito respeitosos comigo, me ensinaram tantas coisas. Só que eu vou explicar uma detalhe que faz toda diferença. Nunca houve um produtor melhor para mim mesmo do que um tal de Guilher,e Arantes. E eu banquei ele, também, até ele aprender, porque é errando que se aprende… Mas ele tem uma vantagem :  é vitalício, e não me abandonou jamais, nem me abandonará. . Aprendí isto só agora. Fui gravar meus pianos de um trabalho novo. Jamais houve nada parecido. Uma humilhação total. Uma combinação de local, instrumento, de microfones e pré amplificadores sem nenhum termo de comparação em toda a minha vida. Quando eu puder revelar finalmente do que se trata, vai ser um assombro. Nunca um produtor conseguiria o que eu conseguí proporcionar para puro deleite do meu público , com muita luta e competência. Desta vez foi demais. Em breve se revelará.

E hoje eu olho pra trás, com tanta alegria de ter sido sempre assim, e de ainda hoje, e mais do que nunca , continuar a ser assim.

A Música é um sonho para quem quiser sonhar. Mas tem que querer, muito.

Cheers !

Enxergar Colorido

Às vezes me dá vontade de não voltar. De não voltar pra realidade, de não retornar para aquilo que deveria ser o meu lugar…às vezes dá a impressão de que aquele lugar para o qual eu deveria voltar é apenas uma lembrança vaga, nada mais existe, tudo mudou, todos mudaram, é como se tudo que eu entendia como sendo conhecido agora fosse apenas um sonho e que a minha viagem atual, que é um sonho, fosse a verdadeira realidade. E o pior, ou o melhor de tudo  é que eu sei que é assim mesmo ! As vezes não dá a menor vontade de aterrissar. Não faz o menor sentido aterrissar. Não dá nenhuma vontade de assistir os sonhos que agora são reais se desmancharem na paleta de cores desmaiadas que é oferecida pelo mundo fantasioso que se insiste em chamar de real. Lá fora, lá longe, lá atrás, no que se chamava “normalidade” o mundo se debate e vocifera nas possibilidades precárias do embate bruto das leituras possíveis dos sonhos de cada um, e eu me sinto um nada, nadando, desesperado num mar se impossibilidades e de naufrágios…Aqui, não. Aqui, no conforto da minha estaçãozinha de trabalho, eu viajo no meu sonho. Aqui tudo é possível, não se esfarela e não se desmorona como lá, na chamada “realidade”. Aqui, está o meu sonho grandioso e íntegro, amadurecido de dentro pra fora num processo de qualidade total e compromisso com a minha essência mais profunda. Aqui, o produto do meu sonho parece completamente plausível, o meu voo não tem amarras, minha poesia não conhece limites, a beleza, a delicadeza e a sutileza são plenamente possíveis e realizáveis. Lá, naquele absurdo que um dia chamaram de realidade, o buraco é mais embaixo. Sempre o buraco mais embaixo. Lá, a incompreensão e a mediocridade vão sempre se contrapor a tudo de mais nobre que eu sonhasse. O “sucesso” é como um rato que você precisa matar. E você não pode deixar um buraco, uma fresta, um ralo sequer que sirva de escape para esse rato fugir. Se houver uma mísera falha no reboco da parede, esse rato desgraçado chamado “êxito” escapará. Aqui, na minha “estaçãozinha de trabalho, eu consigo engendrar um mundo novo, onde cada idéia, cada criação vai crescendo, vai crescendo, vai tomando forma, desabrochando como um milagre que me faz reviver a cada instante… Aí, quando eu estou no auge da minha empolgação, entusiasmado com a minha capacidade de ser criador,  eu começo a pensar na interação que existirá dessas maravilhas que eu estou criando com tudo aquilo que eu deixei lá atrás, no momento em que decolei para a minha viagem desbravadora, tudo aquilo que ficou lá no chão duro da “realidade”, todos os meios e veículos de acesso que farão de tudo para impedir que os meus sonhos se espalhem e consigam transformar o mundo… aí começa o meu pesadelo. Porque o mundo não quer ser transformado. Porque o mundo faz de tudo para insistir na sua feiura e mediocridade. Aí eu lembro que vou me encontrar com todas as formas de corrupção e de deliberada incompreensão, porque o mundo tem uma natureza má, e que essa natureza perversa só é vencida com muita dificuldade pelos sonhadores que viveram voando como eu. Aí eu lembro que, se dependesse do que sempre foi “normal” para o mundo, todos os delirantes e sonhadores da História teriam desistido dessa mania de criar o novo. Quando eu lembro de todas as formas de corrupção que os meus sonhos vão encontrar pela frente, quando eu lembro de todos os obstáculos propositais que farão de tudo para impedir que os devaneios de todos os sonhadores possam frutificar, eu tenho vontade de entrar de novo no meu casulo da minha estaçãozinha de trabalho, onde tudo é possível. Será que eu sou normal ao enxergar colorido ? Será que as pessoas como eu precisam de um tratamento para voltarem a enxergar só em escala de cinza ? Ou a vida é assim mesmo ?

Estrela Mãe

Mamãe.
Como você sabe, estou na Espanha desde antes do último Natal.
Antes de vir pra cá, estive com você e a Ana em Santos, no show de Natal da Prefeitura, e ficamos juntos no Hotel Atlantico, um antigo cassino, e eu fiz questão de me hospedar com você no quarto duplo, deixando a Ana na Suite enorme que haviam reservado pra mim.
Você estava contente, porque era época de Natal, e a atmosfera daquele lugar trazia para nós lembranças de épocas clássicas, de décadas que pertencem à nossa história, que vivemos juntos em tantas férias, da Praia Grande, de Peruíbe, de Mongaguá, as aventuras no Guarujá, em Araxá, em Águas de São Pedro, em viagem pelo Sul, por Curitiba, Porto Alegre, Florianópolis, Blumenau, em viagem pelo Centro Oeste, passando por Ribeirão Preto, Franca, Uberaba, Uberlândia, Goiânia, termas do Rio Quente, em remotas viagens pela Foz do Iguaçú, com idas à Argentina e Paraguai, e até nossas duas generosas férias no Hotel Mabu das Cataratas. Lembranças elegantes daquele Reveillon chiquérrimo lá em Foz, que eu tive o privilégio de compartilhar com você, lembranças de cheirinhos e sabores de tantos Natais que passamos juntos, desde os Natais mais simples lá em Santo Amaro, aos Natais de Araraquara com a vovó e o vovô…
Tudo isso perpassava na minha cabeça quando você já dormia na cama de casal e eu deitado na cama de solteiro ali do lado, olhando o teto que refletia as luzes que vinham da avenida da praia.
Eu inconscientemente sabia que seria uma das últimas oportunidades de estarmos juntos daquela maneira…Fiz uma homenagem no show para você, que foi ovacionada por dezenas de milhares de pessoas… Acho que foi um clímax de celebração da sua personalidade.
Agora que estou aqui em Ávila, vendo as andorinhas voando aos milhares no por do Sol das muralhas, recebo a notícia que você resolveu voar como uma andorinha pra que eu ficasse aqui no chão da Terra lembrando cada pedacinho da sua companhia neste mundo de Meu Deus…
Lembrando que eu e a Ana éramos pequenininhos e você cantava o tempo todo, cantava na lavanderia da casa de Santo Amaro, cantava pendurando os lençóis no varal, cantava dançando tango com o cachorrinho Jobo.
Você espalhava os ovos de páscoa no jardim e o Jobo achava e mascava vários ovos com papel alumínio e tudo. Você assava o coco pra soltar da casca, e depois jogava no chão de cimento pra quebrar…pronto… lá estava o Jobo de tocaia pra roubar uma cuia de coco e fugir de você…aí você ralava e espremia o coco num pano pra fazer manjar branco.
Como não lembrar de você e sua inolvidável sopa de aveia ? e a sopa de ervilha que eu não suportava porque era arenosa na garganta ?
E o seu rosbife, seu bolo Campineiro ?
E quando a Heloisa nasceu, eu tinha 9 anos e via você amamentando, uma cena que me marcou profundamente, porque além de mãe, acima de tudo, você era uma mulher e tinha peito com leite !
Mas essa Hebe não é exatamente do que eu queria falar. Essa foi uma das suas personagens. Havia outras.
Havia a Hebe de tailleur, cliente da Sloper, indo de bonde para o Mappin, me levando pra cortar o cabelo meio-americano que eu odiava porque raspava as laterais… e tomar Ice Cream Soda na Leiteria Ipiranga.
A Hebe que comprava material escolar na loja do MEC na Escada Rolante da Galeria Prestes Maia, que comprava biscoito na Aymoré da Praça do Patriarca… A Hebe que tomava as lições e que era brava pra caramba !
Um dia, há uns 15 anos atrás, fomos para o Hotel dos Lupo em Araraquara, e pude reunir você com a sua irmã Nelly, que não se viam havia anos, e aquilo foi muito bom para nós. Você veio conversar sobre isso, me agradeceu pela iniciativa, e eu aproveitei pra levar um papo sério com você : dizer que eu te amava, e eu sentí que, pela primeira vez, você estava me escutando de verdade. Conversamos sobre a sua vida. Horas a fio. Você contou sua infância e mocidade, contou daquele jeito coloquial que não entrava muito em sentimentos. Foi quando eu pude dizer com todas a letras o quanto eu hoje compreendia o anseio da sua mocidade de ser uma mulher independente e trabalhar.
Foi quando eu pude dizer que eu também teria sido apaixonado pela Hebe na época em que o papai a conheceu. O quanto você era bonita, elegante, culta e determinada: o quanto você era simplesmente imperdível e o papai não vacilou.
Mas depois, numa época ainda rudimentar da luta das mulheres, você teria sido prejudicada porque depois da maternidade não conseguiu reatar a sua história profissional, e nós vimos você triste muitas vezes dentro de casa, chateada e como o papai dizia, neurastênica.
Eu disse pra você que hoje eu te entendia muito bem, no seu sofrimento e frustração, como o papai um dia te entendeu e você finalmente voltou a trabalhar como bibliotecária. Naquela época, eu ví seus olhos brilharem de novo ! Tudo isso eu tive a chance de conversar cara a cara com você, sem interrupções, sem distrações. Foi um momento ímpar pra mim. Finalmente eu me encontrava com a minha mãe. Pra nunca mais desencontrar.
Me lembro que, depois dessas conversas, você se emocionou, me abraçou, entrou no ônibus pra São Paulo e ficou dando tchauzinho enxugando os olhos com o lenço.
Para mim, a última lacuna que havia com você estava preenchida: ver você chorar de emoção por um carinho meu, uma palavra de compreensão. No mais, não faltava nada pra gente ser mâe e filho.
Você é o meu maior exemplo de determinação e de planejamento na vida. Você foi incrivelmente sagaz e certeira na forma de administrar as suas escolhas, inclusive participando de forma decisiva na estratégia profissional do papai. Papai era um gênio abnegado e extremamente humano em sua generosidade. Você foi determinante pra ele crescer na profissão, e para nós, filhos, termos o alicerce pra tudo o que conseguimos ser no mundo. Querida no trabalho, animada nos passeios, uma figuraça alegre e espirituosa, muito educada e articulada em todas as situações, você nunca deixou de brilhar. Vivaz, nunca deixou de ler os seus jornais. Você nos ensinou a sermos simples e realistas, não termos preguiça de aprender sempre, de manter o senso crítico e de gostar dos desafios, um degrauzinho de cada vez, deixando de lado a picaretagem da pretensão e dos delírios de grandeza. Você demonstrou inclusive grande poder visionário, e os seus projetos e fórmulas de vida perduraram até este momento, em que você decidiu partir.
Só existe uma palavra pra eu te dizer, mamãe : parabéns.

Pra Mim…Basta um Dia…

Um dia eu achei que eu nao viveria sem a minha pureza da infancia, sem a casa lá em Santo Amaro, sem o meu carrinho de rolimã, sem meus óculos escuros da Otica Lupo de Araraquara ( que a vovó Iracema me deu).
Sem a minha luneta, sem aquele galho no meu ipê roxo no jardim . Sem a minha bola “autografada” pelos craques de 62…
Um dia achei que a vida seria eterna para minhas pescarias em Mongaguá e no Guarujá e que o tempo seria infindável para a minha
mocidade….Achei que tudo se acabaria na Guerra Nuclear, e que o mundo nunca mais seria o mesmo depois daquele Festival da Record de música popular. Que eu seria eternamente contracultura e contra o Sistema.
Quando as espinhas no rosto , que na adolescência eu pensei eternas, quando elas enfim me largaram, eu me achei belo no espelho, achei que não viveria sem o esplendor da juventude.
Um dia eu me ví famoso e que o mundo sorria para minha fama… pensei que não viveria sem aquele sucesso todo na televisão …
Um dia eu me ví gratificado por uma quase unanimidade…me achei, por um instante, o máximo, e pensei que não viveria sem reconhecimento do mundo !
Um dia , e já vai longe esse dia, já ficou lá atrás, eu pensei que não viveria sem a minha São Paulo, querida.
Um dia eu julguei que não viveria sem a minha Faculdade de Arquitetura.
Outro dia longínquo eu pensei que não viveria longe dos Jardins, do Centrão de SP, da Vila Mariana, de Pinheiros, do Alto da Lapa…
Depois pensei que não viveria sem o meu adorado e adorável Rio , sem a minha paixão eterna por Copacabana, Leblon. Ipanema, Tijuca, Vila Isabel, Penha…
Pensei que jamais me apartaria do Arpoador, da Praia do Diabo, Posto Nove, Farme, Galeria River, do Baixo Leblon, da minhas caminhadas pelo Calçadão …
Pensei que os filhos seriam crianças por um looongo periodo…a Barra da Tijuca…eu viajava de aviao e olhava lá de cima o “meu Rio…”
Mais tarde, pensei que outra Sao Paulo corria nas minhas veias, da Vila Madalena, Sumarezinho, do Itaim, a piscina do Pinheiros, pensei que não viveria sem o meu carrão , sem a minha mountain bike…várias coisas materiais que eu venderia e esqueceria depois, sem pestanejar, o menor constrangimento…
Pensei que eu nunca nais viveria sen correr 8 km por dia, sem nadar 2.000 metros 80 piscinas todo dia !
Pensei que Londres e o Hyde Park fariam parte pra sempre da minha vida, Knightsbridge, Candem Town.
Pensei que Prince reinaria para sempre imbativel.
Pensei que Nova York teria sempre a minha cara, com os recantos do Gramercy Park, Riverside Drive , Columbus, e minha familiaridade com o Central Park seria uma parceria eterna.
Um dia, pensei que Woodland Hills, o Reservoir de Hollywood, Toluca Lake , Agoura Hills, Calabasas, o Topanga Canyon, Santa Monica, Santa Barbara..
Pensei que tudo isso faria parte de mim .
Pensei mais tarde que a carreira havia acabado, que eu seria um traste, pensei que meu desencanto seria definitivo…
Pensei que o meu empresario na época queria que eu gravasse um disco de covers, que era moda nos anos 90, e que nao havia mais futuro para uma peça de museu como eu. Empresario sem noção … me perdeu…como as coisas foram esfarelando em mim…a vida é beira de mar, e as ondas batem e comem todas as nossas obras feitas para conter o tempo…
Depois pensei que eu renasceria em outro sonho, e que minha vida seria na Bahia, que Barra do Jacuipe seria a minha parada final, etc., etc. ,
O fato é que pude renascer. Um milhão de vezes.
Aí vim parar na Peninsula Iberica…
E aqui estou eu vivinho da silva, com meu sonho mais vivo do que nunca.
E como existe o meu sonho no mundo, esse mundo é o meu lugar.
Tudo se destruiu.
Tudo perdurou.
E tudo agora me parece fazer sentido , absolutamente transitório.
O importante é constatar que estamos vivos onde nosso sonho estiver.
Nossa casa é o nosso sonho.
Nossa capacidade eterna de chorar.
Como eu chorei cada vez que fui tocado por algo indizível, uma inspiração estranha que me faz familiares os espiritos dos lugares mais inusitados. O Eterno faz parte de mim.
Sempre fez. Me fez chorar no Japão, no Jalapão, em Compostela, no Porto, em Piacatuba de Leopoldina, em Macapá, em Foz, em Buenos Aires, no Bonfim, em Villas, em Itapoã e Abaeté Sagrado, e diante daqui da Santa Tereza, do Rio Adaja, por onde teria passado Tiago e agora passamos nós numa aventura riquissima de coincidencias, serendipidades, revelações e milagres de proteção e confiança mutua com esse Eterno.
O resto não é nada, além de circunstâncias e de lindas lembranças. Para sempre.
Seja lá o que tenha sido, valeu a pena e é instransferível, inegociável.
Um dia eu vou lembrar que um dia eu terei sonhado compartilhar , e que também sem esse compartilhamento eu não viveria !!!

Redes Sociais Vazias

Cada um tem o seu jeito.
Mas às vezes parece que o restante do mundo tem um jeito só de ser e existir: Redes sociais.
Sobreviver significa ter algum significado nessa nova “pólis” eletronica.
Pior: com essa nova “peste” disseminada, impedindo a normalidade da “polis” tradicional, tudo se moveu ainda mais radicalmente para as redes.
Pathos.
Somos muito, muito criticados pelo nosso modo de ser.
Todo mundo diz que precisamos mudar porque as coisas são como são no mundo e estamos ficando obsoletos com nossa estranheza, que não atende aos requisitos e aos “compliances” da modernidade.
Hoje em dia é dominante um modo de se existir e de se comunicar com essa modernidade.
Somos antigos e muito estranhos, pela nossa desnecessidade de ficarmos conectados angariando views, likes e estabelecendo links e sinapses por toda parte.
É o tempo dos “feats” e meus colegas de profissão, praticamente todos, vivem correndo de cá pra lá, pegando emprestados os grampos alheios no absurdo e falso alpinismo social das redes, em busca dos píncaros de significado: Milhões de views, de likes, como enxames de insetos, como cupinzeiros do Planeta.
Somos alheios a ratos e baratas nos esgotos, nos tubos do metrô.
São milhares de mundos subterrâneos e segmentos de “mercado” , e daí ?
Porque somos assim ?
Estraga-prazeres de um mundo perfeito interligado, somos criticos e achamos tudo engraçado e triste, ao mesmo tempo…
Não encontramos prazer nenhum em aderir ao frenesi de postagens em redes, e raramente nos pegamos falando como zumbis para as camerazinhas do celular.
Não estamos presentes, como “Wallies” eletronicos ( e Onde Está Wally ?) : vemos sim a Espécie Humana feita de 8 bilhões de Wallies que estão por toda parte !
Todos querem falar .E todos falam, e o mundo segue absolutamente indiferente .
Todos a exibirem seus predicados e convicções… um bando de loucos ?
Os ideológicos, com seus risinhos de superioridade , suas piadinhas, seus discursos e arrazoados, todo dia, toda hora, martelando o que pensam ser suas idéias, para suas bolhas inúteis, um saco.
Os vazios, postando seus novos invólucros corporais, suas lacrações e empoderamentos ilusórios.
E todo mundo falando ali, dançando ali, cantando ali, se exibindo ali, gesticulando ali, caras e bocas ali, tudo ali, o mundo voltado para ali, aquela lentezinha miserável de camerazinha embutida num aparelho de transmissão, supondo ali ser uma emissora, para um público ali do outro lado daquela lentezinha miserável.
E muitas vezes o tal publico existe e é consagrador.Que mundo é este ?
Quem é essa gente toda ?
Quem somos nós ?
Onde pretendemos chegar ?
Piada do Universo ?

Olhos Fechados para Ouvir Musica

Fico escrevendo musicas e letras e a cabeça fica viajando !
Letras incriveis percorrendo tempos e lugares muito criativos, em elucubrações delirantes…
Sabe como é cabeça de compositor… viaja loonge…
Aí a imaginação nos faz enxergar coisas, mesmo de olho fechado…que é a nossa tradição , na minha geração pré-videoclip… , de se ouvir musica…de olho fechado !
Na minha imaginação, os clips das minhas novas musicas teriam, hoje em dia , que ir para lugares, situações e tempos impossíveis de se realizar em video.
Seriam produçoes caríssimas, que eu não teria condiçoes de arcar !
Aí eu penso … que tempo chato esse !
Porque as pessoas não podem mais fazer como a minha geração fazia na mocidade ?
Simplesmente fechando os olhos !
Por causa desses pequenos detalhes, é que podemos afirmar com certeza que a “modernidade” ,sendo meramente visual, se tornou infinitamente mais pobre !
Já sei o que fazer !
Lançar um disco suficientemente rico em delirios, especialmente para que as pessoas escutem de olho fechado !
Isso É TRANSGREDIR !
Abaixo a ditadura videografica.
Musica é outro universo .
Deixemos que o mundo superficial da cena pronta e amarrada nas telas e retinas seja mesmo dominado pelos mediocres em sua passividade contemplativa.
Eu quero a Humanidade que fecha os olhos e fabrica o Universo que interessa !
ISSO É REVOLUCIONÁRIO !

Classes de Intelectuais

A cultura de massa do século XX instituiu um sistema de classes altamente elaborado e questionável no panorama da intelectualidade do mundo. A industria cultural, a partir do surgimento do livro, e mais especialmente da imprensa, passa a ser codificada pelos critérios dos donos da opinião, os curadores : o jornalismo cultural estabelece uma Hierarquia de relevâncias, um jogo perverso de implicâncias e indulgências.

Nesse ambiente volátil e intrincado, a opinião corrente, uma vez plantada no senso comum, é uma commodity valiosa e incontornável , que viabiliza ou condena reputações e determina o sucesso ou o insucesso de carreiras e produtos culturais. Como toda mercadoria, a opinião, a qualificação e a cotação artísticas são bens manipuláveis, e esses curadores, até por afinidade, são egressos dos meios intelectuais, e não raro trazem recalques de talentos, de carreiras mediocres ou de incompreensões ( há inclusive vários casos de mentes brilhantes, talentos legítimos, que usaram a crítica como meio de expressão – mas não é essa a regra)  e se tornam portadores de prerrogativas especiais para determinar em qual gaveta da relevância do Mundo serão arquivados os artistas, os pensadores do mundo estético, e as suas obras. Arquivados para a vida toda, são raríssimas as exceções. Os resgates post-mortem são comuns. As mudanças de gavetas são raríssimas, e uma vez indexados no Sistema, os artistas geralmente lutam para melhorar de cela nessas verdadeiras “cadeias culturais” – e como este termo é apropriado !

Tenho me debruçado com prazer e vívido interesse nesse assunto, na boa bibliografia existente, e devorei, neste período sabático de recolhimento, uma porção de e-livros extremamente reveladores…Hobsbawn é meu preferido, disparado, seguido de perto por Eco ( este mais superficial e mais fácil de digerir)… Eric Hobsbawn se transformou numa espécie de irmão mais velho…se é que eu posso tratá-lo assim, porque do alto de sua erudição e de seu texto denso e de lenta absorção ( ainda mais no inglês original, repleto de termos e expressões que merecem e precisam de permanente, imediata tradução…sob risco de prejuizos ) o querido Eric se revela bem humorado e certeiro na sua finíssima mordacidade…Depois que o leitor se habitua a essa densidade e a todo seu refinamento, a coisa muda de conversa. Tantas coisas que já sabíamos passam a ser confirmadas em detalhe e desmistificadas em nossos corações magoados por um mundo até então incompreensível.

O mundo “moderno” da industria cultural se revela muito mais complexo em suas razões, e muito mais simples em seus resultados.

Um resultado imediato e aplicável ao nosso mundo real e contemporâneo, em nossa realidadezinha provincial da musica popular, em nosso vilarejozinho recôndito e esquecidíssimo do mundo, chamado Brasil, é a pergunta que não quer calar : como é que se pôde estabelecer, para a nossa geração da Música, um panteão de Vacas Sagradas cuja Trindade Suprema são poetas não-músicos, enfim, que não manjam nada de música ? Ignorantes totais de sons e instrumentos ? Como é que acontece isso, e, olhando-se bem, não é só no Brasil ? Porque a Música é assim tão maltratada… em nítido benefício de outras modalidades de relevâncias… Preste atenção e você constatará, como eu, que existe uma sutil hierarquia… Muitas vezes, nem tão sutil : descarada.

Para simplificar, e para resumir com sagaz crueldade, vou enumerar aqui a hierarquia de relevância intelectual, entre os “artistas”, magistralmente construída pelo jornalismo cultural.

  1. No topo da cadeia alimentar da Cultura, estariam os Literatos : Escritores, Poetas, Dramaturgos,  e (obviamente, “comme il faut”) os Jornalistas e os Críticos de Arte. Estes últimos, são como os Parlamentares : legislam em causa própria.
  2. A seguir, numa já bem distante segunda categoria, viriam os Publicitários e os  Cineastas ( a Publicidade e a Indústria do Cinema não raro pagaram a conta dos salários da Imprensa, moradora do andar de cima ) Eu diria que esta segunda Classe anda meio “borocoxô” , meio “cambalache”, porque o mundo deu tantas voltas e despencou na mais elementar truculência… Acompanhado de perto pela Publicidade, o Cinema se rendeu à medíocre fábrica de Blockbusters – há muito que o Cinema vive de recordações : O que foi, e em que se tornou !
  3. Na Terceira colocação, vêm os Produtores e Agitadores Culturais, articuladas peças de ligação entre as artesanias e as prateleiras de mercado. Interessantes e descolados, dependem basicamente de personagens e “lendas” que constróem, formando um contingente efervescente nos ambientes culturais, infiltrados nos gabinetes políticos das Programações Culturais, dos Editais , e com trânsito feérico na mondanitè dos bares e points de onde se fabricam tendências, vanguardas, eventos e patrocínios.
  4. Nas galés, no populacho, “na graxa”, sendo portadores de “habilidades práticas, meramente manuais” , sendo adestrados para atividades mais “emburrecedoras” do que a Palavra, Palavra essa que é supremacia do Pensamento, e que por essas atividades paralelas à Palavra, são desprovidos de intelectualidade mais profunda, estão os músicos, desenhistas e pintores, escultores, atores, bailarinos e coreógrafos.

De minha parte, eu agradeço pelo meu talento de fazer minhas letras. Todas. Não dependo de especialistas na Palavra.

A não ser para julgarem o meu artesanato !

 

 

PERDIDOS NA SELVA

As vezes me deparo com uma citação da musica “Perdidos na Selva”, e fico espantado com a desinformação generalizada do que é, realmente, aquela jóia “cult” do “pop” brasileiro… Já vi muitas publicações na “rede” creditando até mesmo a autoria ao Barão Vermelho, levando a crer que é uma música do genial amigo Roberto Frejat… quando na verdade o Barão regravou magistralmente a canção originalmente gravada pela Gang 90 e Absurdettes. Mas basta dar um “google” para ver que nem a Gang 90 aparece mais !

Resolvi então contar as aventuras, o que realmente aconteceu – a sequencia extraordinária que levou a que esse hit inaugural dos Anos 80 se tornasse um clássico fundamental do Brasil Moderno, e qual a parte que me cabe nessa historia…Não é pouco.

É na verdade um marco indelével na minha trajetória. Esse momento mágico me abriu todos os caminhos poéticos e comportamentais para que eu desse uma guinada espetacular na carreira : gratidão eterna a uma linda amizade poética que me ensinou a destravar a minha liberdade .

Viva Julio Barroso, viva o trabalho criativo coletivo, que envolveu mais pessoas do que se possa imaginar. Julio era um jornalista, DJ , um gerador inesgotável de conteúdo, e pertencia a uma geração de jornalistas e artistas, uma turma muito à frente do seu tempo… amigos que o ajudaram naquele momento de formulação de um movimento : Gang 90 foi na verdade um movimento estético. Foi uma curtição de várias pessoas muito criativas, como Okky de Souza, Denise Barroso, Antonio Carlos Miguel, Katy Pinto, Tavinho Paes, Nelson Motta, Leonardo Netto. Eu,na verdade,entrei para resolver a parada, ensaiar a banda, pré-produzir,e principalmente dar acabamento e viabilizar no estúdio : para isso é que eu fui chamado.

E adorei, como vou contar a seguir…

Embora eu seja muito grato, e dê total valor à minha arte de tocar instrumento, sou genérica e miseravelmente citado na categoria “músicos que participaram da gravação”…
Ora, isso é mais do que uma mentira, é uma sacanagem inconsciente de pura inveja, a tal “inveja santa” de tantas pessoas que gostariam de ter estado ali, e fazer tudo que eu fiz… Fiz acontecer.

Esse papel secundário é uma redução vergonhosa, proposital e despeitada da parte de alguns formadores de opinião que se dedicaram a resenhar o pop rock brasileiro, publicando livros sobre esse incrível movimento,e no afã de dar o justíssimo destaque à genialidade seminal do meu parceiro Julio Barroso,um revolucionário,não por acaso “jornalista” brilhante e colega de redações de toda aquela (ótima) geração da inteligentzia vanguardista do final dos anos 70.

Desde sempre louvarei a realidade,de que Julio Barroso é o autor,evidentemente,de 70% da letra,autor da idéia libertária da banda,um poeta transformador e “figuraça” obrigatoria da cena riquíssima que se projetaria fulminante na abertura da década de 80.

Saboreio e compartilho meu quinhão nessa obra prima..até porque lembrar os detalhes e poder contar essas peripécias é motivo de muita alegria e de orgulho não só pra mim, mas para todos da “banda”, inclusive os posteriores que se agregaram a esse movimento. A Gang 90 é nossa !
É muito minha também, sempre será.

Em 1979 e 1980 eu havia gravado dois discos sob produção do Liminha, para a Warner do Midani, e a gravadora nos tratava muito diferenciadamente, Midani era um gentleman, um big boss afetivo e muito influente com sua cultura e incomparável “mondanité”… Muito acertadamente hospedando os artistas em Ipanema, na Prudente de Morais, altura da Rua Farme de Amoedo, em pleno Posto 9.
Eu costumava naquelas areias escaldantes ( basta ver as fotos da época..kkk. eu paulistão transformado em um quase surfista …invejoso.. pois jamais subi numa prancha na vida … só jacaré , o caipirão …) indo muito à praia, Ipanema, Arpoador…que lindo aquele Rio de 1980… encontrar Marina Lima, Dadi da Cor do Som, as Frenéticas Leiloca e Lidoca, e muitos amigos inesquecíveis como Paulette, Lauro Corona, e o meio artistico inteiro… Quem viveu Posto 9, Farme, no final dos anos 70… pode dizer que viveu boa parte desta vida !
E quem é que morava bem ali na Vieira Souto com Farme ? era o Barrosão, querido pai de duas figuras delirantes, o Julio e a Denise Barroso.
Julio eu conheci ali mesmo, na areia, pisando as ondinhas do quebra-mar… era um cara muito delirante e vulcânico, com idéias mirabolantes que borbotavam em mirabolâncias estratoféricas de sua verve culta que misturava Mallarmé com Kerouac… isso eu me lembro que foi assim, de cara… sem ninguém pra me apresentar, fui abordado por ele. E eu me assustei, talvez eu fosse todo metódico e “certinho”, a primeira impressão diante daquele Júlio Barroso (que eu nem sabia muito bem quem era…) foi querer distância.. me parecia parecido com outros “doidões” daquele período, um estilo que estava tão na moda, Damião Experiença, Guilherme Lamounier, Serguei… Um final de fase do Rock… Contracultura era um alicerce,mas eu era mais contido,mais encucado e com sérias críticas ao lado porra-louca e sujismundo dos velhos festivais de Rock… Só que Julio era literalmente um passo além…Me acendeu uma lampada…
Não demorou muito para que, no final de 1980, Leonardo Netto me ligasse pra São Paulo para me convidar pra fazer a direção musical da Gang 90, que o Nelsinho Motta estava lançando pelo seu selo independente “Hot”, distribuido pela Warner… , Leo sempre foi um amigão querido, diretor de Marketing na WEA, e eu era frequentador da sua casa na Rua Santa Leocádia, em Copacabana, então tínhamos muita afinidade, e eu me sentí atraído pela idéia. Me convenceu a topar.
Eu passava por um período de revisão geral da minha estética, os meus discos roqueiros com Liminha na WEA não tinham tido o resultado que se esperava, o pretensioso “Coração Paulista” havia “flopado” sem sucesso, e eu já estava recebendo cartão azul na WEA : não iriam renovar. Ferrado, eu estava aberto a “experimentar”. Primeiro degrau para o exito… Paradoxalmente frente ao meu desastre, eu tinha acabado de emplacar “Aprendendo a Jogar” na voz da Elis, um hit espetacular mostrando o caminho da simplicidade, da brincadeira, e estava preparando um repertorio mais pop e mais radiofônico – as FMs estavam explodindo no “dial”, e eu precisava “me virar” pra não desaparecer de cena.

Tendo alugado uma casinha na Rua Caramurú, perto da Estação Casa da Arvore do recém-inaugurado Metrô de SP, eu vivia um novo momento, pois eu saía de casa de manhã para “trabalhar” , de Metrô..tudo me parecia novo, com mais liberdade do que em casa ( Marietta era bebê, tinha nascido em Maio…e eu precisava de “ares” novos ) então agora eu tinha um “local de ensaio” – que seria precioso para compor um monte de hits … como “O Melhor vai Começar”, “Deixa Chover”, “Planeta Agua”, “Pedacinhos”… Só lembro que por causa desses “detalhes”, eu era feliz. Eu estava usando intensivamente um “kit” de instrumentos que foi muito importante pra mim. O piano Yamaha CP 70, combinado com um flanger Mutron, o meu velho Minimoog com camera de eco Echoplex Maestro, uma mesinha Tapco de 6 canais com reverber de mola embutido ( que eu havia comprado de segunda mão de uma banda se SP, o Grupo Fragata do Ronaldo Pascoa ), um microfone Shure SM 59 , recém-comprado junto – num abençoado sábado que fui à Leimar na Rua Bandeirantes – com um ítem que seria decisivo naquele momento para compor os hits : uma bateria eletrônica Electro Harmonix DRM16 , um stompbox precaríssimo, muito “disco” , muito eletrônico, mas que apesar das limitações, me ajudaria a colocar ritmo nas minhas musicas. Eu tinha um par de caixas Lando enormes funcionando como monitores… e estava compondo compulsivamente, tentando salvar a minha carreira.

De grana, eu estava arruinado. Sem sucesso e sem shows, tive inclusive que vender uma bateria Ludwig azulzinha , que eu tinha ali guardada mas não tinha banda para usar… acabei vendendo ela para o Eduardo Lemos da Transassom, por 2.000 dolares, para pagar os aluguéis atrasados de minha casa na Rua Juaracê, Vila Mariana, aluguéia que estavam vencidos há 4 meses e eu estava sendo despejado, com a Marcia e a Marietta…

Mal eu sabia…. aquela bateria, 3 meses depois, com o estouro de Deixa Chover, eu alugaria pelos mesmos 2.000 POR SHOW !!! É a vida ! Eu jamais poderia imaginar que eu estava a 3 meses de me tornar o numero 1 no Brasil…

Então nesse meio-tempo resolví aceitar a empreitada de dirigir a Gang 90.

De cara, com a letra do Julio Barroso na mão, fui dedilhando uma levada com a bateria eletronica e o Piano CP 70 com seus graves poderosos, bem à la Billy Joel, com um riff que remetia ao “Coração Paulista” que eu tinha lançado no primeiro semestre de 80… só que a batida, com a DRM16, estava na onda da Rita Lee com Roberto, de “Chega Mais”, de “Corre, Corre, Corre”… eu estava no caminho certo…porque estava divertido. Eu era muito resistente ao “bumbo reto”da onda “DISCO” que dominava a cena mundial, e, claro, a cena brasileira… Isso já havia rendido, no passado, muitos debates com o meu produtor e diretor artistico Liminha, nas nossas sessões de estudio recentes, e eu tinha uma “vergonha” da batida reta – teimoso, fazia o meu proprio processo de composição ficar engessado no preconceito… Com a chegada da stompbox rítmica, porém, eu agora ficava me deliciando em ter aquele “drive” rítmico nas mãos, com as teclas mais graves do CP70 fazendo linhas de baixos em oitavas, na verdade eu estava me reinventando, oxigenando meu som .

Perdidos na Selva seria uma OPORTUNIDADE DE MERGULHAR SEM NENHUM PUDOR NAQUELA BATIDA, porque não seria um produto do Guilherme Arantes, para o Guilherme Arantes … era uma experiência especialmente encomendada para uma banda “fabricada”, o descompromisso era total… então eu deitei e rolei propondo aquele “drive Disco Inferno” modernoso e “comercial” . Sem querer, só de brincadeira, eu estava “ inventando o Pop” …Aquela introdução histórica, com toques de progressivo no trinado agudo do piano e poderosos acordes heavy metal fazendo o suspense incendiário, realmente se tornaria um marco no Pop Rock e fulminava o publico instantaneamente. Lembrava Silvester, lembrava grandes hits de pista. Eu queria impressionar Julio, a turma do Julio, o Nelsinho, e toda a “inteligentzia” da crítica musical ali representada, e principalmente a Warner que estava me dispensando, então estava tentando dar o melhor de mim .

O grande problema de Perdidos na Selva era a FALTA DE UM REFRÃO. Não existe hit sem refrão. Para resolver logo aquele impasse, compus música e letra do trecho “Eu e minha gata rolando na relva… rolava de tudo… num covil de piratas pirados… perdidos na selva !!! “ …

Julio adorou, Nelsinho e toda a turma aclamou : é Hit.

Esse refrão se tornaria o maior sucesso da banda, até hoje. Outros músicos, mais tarde, imprimiram suas competências, suas marcas, cito como exemplo o Herman Torres, guitarrista, que fez Nosso Louco Amor, que viabilizou a Gang 90 em outro grande sucesso da banda, dois anos depois. E Herman, na História Oficial que é contada, também foi reduzido à categoria de “músicos que participaram” …

Voltando a “Perdidos na Selva”, foram então iniciados os ensaios com aquele bando de malucos: o Júlio, feliz da vida porque agora já o sonho virava realidade, e a música tinha agregado agora o refrão explosivo – o aroma do sucesso estava no ar, uma euforia só . Os músicos, excelentes, eram o Gigante Brazil ( Bateria) um velho amigo das batalhas contraculturais do circuito Bexiga/Morro dos Ingleses, um baterista mortal, tribal, um relógio !
Puxa que saudade… como eu adorava o Gigante !!… e mais duas novidades pra mim, o Wander Taffo ( Guitarra) e o Celso Vechione ( Made in Brazil , Baixo )… Músicos que haviam sido escolhidos num critério de “ecletismo” total – a ideia era formarmos uma espécie de “cover” de “Kid Criole and the Coconuts” – essa concepção Júlio trazia na raiz da idéia, era coisa que havia sido concebida ainda em Nova York, em suas temporadas de DJ…E eu ajudei também a formatar o restante do repertório, todo ele genial, concebido por Julio. Tinha um pouco de tudo naquele caldeirão. O sopro poetico delirante de Julio entrou como uma aragem , um vento revolucionário no meu espaço criativo particular, e eu me sentí abrigado numa turma nova, uma sensação de completa renovação. Pra mim, algo mais: eu estava brilhando do lado de dentro da imprensa especializada mais moderna, e Julio adorava as musicas que eu estava fazendo na época, como “Todo Mes de Maio” – era um incentivo importante numa hora crucial.

Como vocalistas haviam a genial holandesa Alice Vermeullen – mais tarde rebatizada artisticamente como Alice Pink Pank ,na epoca ainda “paquera”do Julio, recém chegada ao Brasil, a Denise Barroso, sua irmã, uma pessoa muito querida e afetiva, poetisa, engraçadíssima, casada na época e vivendo com Okky de Souza (meu amigo jornalista e já parceiro de letras, que na época frequentava a minha casa ), a Luiza Maria, que era discotecária junto com Julio Barroso e Dom Pepe nas casas de Nelson Motta, e para completar as “Absurdettes”, a Mae East, Maria Elisa Pinheiro, uma cantora muito criativa e artista de vanguarda, que na época estava namorando o Nelsinho Motta. Nelsinho havia inaugurado num shopping da Av. Faria Lima uma discoteca “cult”, a “Paulicéia Desvairada” e ali a Gang 90 teria seu palco de estréia e de residência, já que Julio e Luiza comandavam as Pickups.

A Gravação Histórica : Devidamente ensaiados os músicos (era uma curtição total, já que a combinação com Gigante Brazil e com a guitarra fulminante de Wander Taffo rendia um “drive” inacreditável com o meu piano. Estava inventado o Pop dos anos 80. Fomos então para o Estúdio na Rua Bocaina 72, o Nosso Estúdio , um point importante da música brasileira , e numa única sessão, uma tarde e uma noite, gravamos, sob o comando do saudoso amigo Marcus Vinicius, o legendário “Vinicão”, as bases, vocais e mixamos “Perdidos na Selva” para ser o lado “A” e Lilik Lamê” , o Lado “B”. Claro que, sob todos os aspectos, todos confiavam plenamente no meu taco, eu era o produtor, arranjador, fazendo milagres, com grande alegria, porque afinal era “só” uma brincadeira …Perdidos na Selva, uma parceria legítima e inesquecível de Julio Barroso comigo, teve a minha voz à frente, porque simplesmente ninguém da Gang 90 ou Absurdettes ainda sabia mesmo cantar … exceto, é bem verdade, a Alice , pois era a mais descolada musicalmente, afinada e refinada com suas influências européias. Mais tarde, ela mostraria seus talentos . Naquela circunstância, alguém teria que tomar a frente e liderar o côro. Na mixagem, Marcus Vinicius exagerou na minha voz…acabou ficando puro Guilherme Arantes com umas notas de Gang 90 !!! Além do arranjo, do piano, fiz aqueles chiquérrimos “Minimoogs” ao estilo de Gary Numan ( que eu ouvia muito naqueles meses, junto com Warren Zevon, The Cars, David Edmonds e outros …)

Já Lilik Lamê teve a voz de Denise , um pouco titubeante mas tão verdadeira – justamente porque não era cobra-criada, era espontânea, uma música linda de Siouxie and Banshees, canção de John Severin, bem pós-punk , com letra de Julio com Katy Pinto e A.C. Miguel.

Com a inscrição de Perdidos na Selva no Festival MPB Shell-81 , eu fui obrigado a escolher uma canção para prosseguir no festival , já que Planeta Agua estava inscrita e também foi selecionada . Guto Graça Mello, diretor do Festival, me ligou para resolvermos como ficaria resolvido esse impasse, pra eu não ser desclassificado ao descumprir o regulamento… Ora, para mim, não tinha problema algum abrir mão da parceria com Julio, para efeito daquela circunstancia do Festival, já que a Autoria , assumida no Copyright da Editora, poderia ser revista mais tarde – Julio era como um irmão para a gente.

Era como um irmão para todos nós, todos os que conviveram com ele.

De minha parte, sei que foi reciproco.

Não houve tempo… e nem motivação da minha parte… para modificar os créditos daquele Copyright editorial. Ficaria como um presente para Julio, por tudo que ele nos deu de inspirações.

Essa é a história verdadeira de “Perdidos na Selva”, que eu gostaria que nunca mais fosse esquecida. E nem reduzida a uma mera “participação de músico” numa ficha técnica de um Compacto Simples transformado em raridade de colecionador.

O Grande Satã Dualista

O GRANDE SATÃ DUALISTA

Grande é o Satã

Da Dialética, dos debates sem fim…

Se mostra imbatível, sem contendor… aniquilando inimigos de ambas as partes…

Ele Venceu !

O Mundo se reduz a essas 2 dimensões cativas… Num Complô Macabro contra toda visão multifacetada como deveria ser enxergada toda Realidade… Tudo Farsa !

Na Realidade, não existe essa mística pobre de Dualismo, nem mesmo nas Religiões !

Acordem ! Prestem atenção nos tempos de dissuasão que estamos assistindo e tentando pateticamente representar !!!

A qual burrice você pretende se alistar ???

Defeito de nascença

Porque não acredito na politica ?

Por um defeito de fabricação em todos , e eu digo TODOS os personagens da política.

Todo indivíduo que se atribui um papel de SOLUÇÃO PARA OS DEMAIS …

tem um componente patológico :

É UM SOCIOPATA.